O professor Luciano Ribeiro Bueno, demitido da Universidade Estadual de Ponta Grossa (UEPG) por assédio sexual, confessou ter oferecido aumentar a nota de uma aluna em troca de favores sexuais, segundo a Procuradoria Jurídica da instituição.
De acordo com o relatório final do Processo Administrativo Disciplinar (PAD), ao qual a nossa reportagem teve acesso, o professor enviou mensagens escritas, áudios e vídeos para uma estudante do curso de Economia.
"Está confessado pelo indiciado a prática de atos de natureza sexual, inclusive com o convite expresso em áudio e mensagens para ceder a favores sexuais, em troca de possível atribuição de nota, o que caracteriza o constrangimento da vítima, com a prevalência de sua condição de superioridade, seguida da sua repulsa", diz trecho da conclusão da procuradoria.
De noite, Luciano convidou a aluna a ter relações sexuais com ele, perguntando o que ela queria em troca de sexo. Leia todas as mensagens mais abaixo.
Em nota, as advogadas de Luciano disseram que não houve provas que o professor agiu "no sentido de se valer de seu cargo para ofender a aluna em questão".
A defesa também afirma que o caso aconteceu em um momento em que o professor passava por problemas psicológicos, que levaram ele a "interpretar equivocadamente as mensagens trocadas com sua aluna fora do ambiente de sala de aula". Leia a íntegra ao final da reportagem.
Para a equipe jurídica da universidade, o argumento da defesa do professor de que ele estava com o estado emocional alterado "não foi suficientemente comprovado para afastar a gravidade da conduta cometida".
A procuradoria também refutou o que chamou de "tentativa de criminalização da vítima":
" A tentativa de criminalização da vítima por parte do Indiciado, ao afirmar que que o seu comportamento teria sido o estopim para a sua conduta, bem como que aquela abriu por mera liberalidade o conteúdo dos stories que mostra uma genitália masculina, é uma estratégia distorcida e que merece ser refutada, sob pena de se estar imputando a esta a responsabilização pela conduta repugnante do ofensor".
A equipe jurídica da UEPG ainda indicou o uso indevido de autoridade no caso.
"O indiciado também não nega que utilizou de sua condição de superioridade hierárquica, enquanto docente, para fazer propostas a Denunciante em troca de 'melhorar a sua nota'", aponta.O parecer da procuradoria é assinado por Adriana de Fatima Pilatti Ferreira Campagnoli, Chefe da Procuradoria Jurídica.
Análise jurídica foi solicitada após divergência da comissão
A comissão do Processo Administrativo Disciplinar era formada por três professores: a presidente, Suellen Aparecida Alves, e os integrantes Luiz Gustavo Lacerda e Márcia Santos da Silva.
No relatório, a comissão cita a "gravidade da descompostura do servidor" a partir da avaliação da denúncia e também frente ao fato de ele não ter negado a ação. Contudo, houve divergência entre os integrantes, que recomendaram a suspensão de 60 dias, e a presidente, que indicou a demissão.
Deste modo, o reitor da universidade, Miguel Sanches Neto, solicitou um parecer jurídico.
Suellen Aparecida Alves, que discordou dos colegas, afirmou que o professor, ao justificar a conduta sob "o argumento de que interpretou mal os olhares da vítima", acabou culpando a vítima.
Para a professora, "a punição no caso deve ter um escopo não somente punitivo, mas também pedagógico, de modo a acenar para toda a comunidade universitária que a UEPG não compactua com comportamentos dessa natureza".
O caso avançou para demissão de Luciano após o vice-reitor da UEPG na ocasião, Ivo Mottin Demiate, deliberar sobre o assunto.
No despacho que consta no Processo Administrativo Disciplinar, Demiate não acatou o relatório final, mas sim as razões apresentadas pela presidente da comissão que discordou dos outros integrantes em relação à penalidade, e decidiu pela demissão do servidor.
Veja a cronologia das mensagens até a demissão do professor da UPEG
- 21 e 22 de julho de 2022: Luciano manda as mensagens;
- 2 de agosto de 2022: Aluna denuncia caso na ouvidoria da UEPG;
- 3 de agosto de 2022: Chefia do Departamento de Economia sugere afastamento temporário dele;
- 4 de agosto de 2022: Reitoria autoriza abertura do Processo Administrativo Disciplinar (PAD);
- 8 de agosto de 2022: Professor é afastado;
- 18 de novembro de 2022: Comissão recomenda suspensão do professor por 60 dias após ouvir defesa;
- 18 de novembro de 2022: Presidente da comissão opina pela demissão de Luciano, mas diz que teve voto vencido;
- 6 de dezembro de 2022: Jurídico da UEPG diz que decisão cabe à reitoria;
- 13 de dezembro de 2022: Vice-reitor assina a portaria de demissão;
- 5 de abril de 2023: Despacho da demissão é enviado à Procuradoria do Paraná. Conselho Universitário reiterou a decisão pela demissão;
- 13 de abril de 2023: Procuradoria dá parecer positivo ao ato;
- 9 de agosto de 2023: Governo Estadual decreta demissão de Luciano Ribeiro Bueno.
Mensagens começaram com oferta de 'ajuda'
O contato do professor com aluna, por meio do WhatsApp, começou na madrugada de 21 de julho de 2022, com duas mensagens. Ele as apagou e, pela manhã, enviou novas mensagens se apresentando.
Conforme a conversa avança, ele questiona o motivo de ela não estar indo para aula.
Depois, ele a informou que ela tirou nota baixa em um trabalho e ofereceu a possibilidade de a estudante refazê-lo. Afirmou, também, que poderia passar as questões via WhatsApp.
Ela respondeu: "Entendi professor".
Proposta sexual
À noite, o professor retoma a conversa e pergunta novamente se ela gostaria de receber as questões. Após não ter resposta, ele disse para a aluna que ela o deixa excitado.
"Você sempre olha nos meus olhos. Olha o status. Vai gostar. Vai querer a chance? [...] Deixa prof de r**a dura. Vamos sair? O que quer? Vamos marcar?".
Meia hora depois, a aluna respondeu pedindo para o homem confirmar a identidade em áudio. Ele responde, confirma, e sugere novamente que ela olhe o status dele no WhatsApp.
Nele, o homem exibia o órgão genital, mensagem que podia ser vista por todos os contatos.
Nos áudios, Luciano também convidou a aluna a ter relações sexuais com ele, perguntando o que ela queria em troca de sexo. Após enviar uma sequência de áudios, a aluna respondeu:
"Por um acaso em algum momento eu dei liberdade pro senhor me mandar esse tipo de vídeo, e me fazer esse tipo de proposta?".
Veja, abaixo, os prints das mensagens e as transcrições dos áudios. Os números dos celulares e palavras com tom pejorativo foram borrados: